Natalia Ginzburg me levou pra passear
Como a leitura obsessiva por uma autora italiana tem me ajudado a sair do sedentarismo
Agora tem uma Alexa aqui em casa. Mas eu ainda não sei como lidar com ela. Sempre peço por favor e depois agradeço. Já entendi que preciso parar com isso porque ela dá uma resposta longa, do tipo “gentileza sua, é um prazer ajudar” e nisso interrompe a música que eu acabei de pedir pra ela tocar e quebra o clima. Mas eu não sei dar ordens. Pra mim é inconcebível pedir alguma coisa sem dizer por favor e depois agradecer, mesmo que seja pra uma Inteligência Artificial. Eu não fui feita pra essas tecnologias, nem elas pra mim.
Estou há alguns dias rascunhando o texto desta edição da newsletter mas travei sem saber exatamente sobre o que publicar, exigindo de mim mesma uma edição irretocável com tópicos muito bem definidos. Eu sabia que esse momento chegaria, mas não imaginava que seria tão cedo que a “Patrulha da Fraude” encontraria meu endereço. Tem o quê? Quatro ou cinco meses que eu coloquei essa newsletter no ar. Era pra eu ter um tempo maior de folga para experimentar sem me cobrar tanto, mas não…
Decidi, então, escrever assim mesmo e lutar bravamente contra essa necessidade doentia de escrever com tanta precisão sobre os fatos e discorrer sobre um único tema e compartilhar um recorte de como tem funcionado minha cabeça e as minhas atividades nas últimas semanas.
Neuroses, obsessões e tentativas de diminuir o sedentarismo com a ajuda da literatura
Eu acho que tô numa fase boa da minha vida, mas considero só um achismo porque não sei se dá pra viver e entender a vida simultaneamente. Mas tem sempre uma sensação perturbadora de não estar sendo e fazendo o suficiente.
Eu já deveria estar falando, lendo e escrevendo italiano muito melhor considerando o tempo que eu tô morando na Itália. Gostaria de ter conhecido mais países vizinhos já que estou num continente que me possibilita transitar tão facilmente entre eles.
Queria que as minhas plantinhas não insistissem em morrer, adoraria que a minha casa estivesse sempre limpa e organizada, gostaria de parar de pensar que enquanto eu estou aqui, vivendo longe, meus pais estão envelhecendo, meu sobrinho tá crescendo e eu não estou acompanhando nada disso de perto. Isso me enche de culpa, mas nem por isso me faz repensar em voltar a viver no Brasil.
Queria ter vontade de fazer exercícios físicos, mas, como eu sei que nunca vou acordar com esse desejo repentino, tive que buscar estímulos por meio da minha mais nova obsessão: Natalia Ginzburg.
Antes de morar aqui, minha maior influência literária italiana era Elena Ferrante. E foi através dela que cheguei na Ginzburg. Esmiuçando, descobri que Ferrante bebeu muito dessa fonte. E, pra minha grata surpresa, sua fonte escreveu, boa parte da vida, num apartamento aqui em Turim.
As Pequenas Virtudes foi o primeiro livro que li de Natalia Ginzburg e o amor aconteceu já ali, repentina e irremediavelmente.
O interessante é que eu comecei a ler com expectativas baixas, uma vez que muitos leitores relataram que só foram arrebatados depois de uma certa insistência. Pensei: bom, se eu tiver que insistir, não vai rolar pra mim. Infelizmente não sou esse tipo de leitora persistente. Resolvi tentar motivada pela curiosidade, confesso. Afinal, quem é a musa inspiradora da minha musa inspiradora?
O texto da Ginzburg é seco, sem rodeios, quase não utiliza de adjetivos como recurso e, no entanto, tem um tom melancólico e é (pontualmente) cômico na medida certa, o que torna seu estilo único.
Mas o que isso tem a ver com exercícios físicos? - você deve estar se perguntando. Pois bem. Motivada a descobrir onde viveu a autora que agora é minha atual fonte de obsessão (pois engatei um livro no outro e estou terminando de ler Léxico Familiar, absolutamente absorvida e já ansiosa para começar o próximo da lista - Todos Os Nossos Ontens -, principalmente depois de ler a excelente resenha da Sarah Germano), fiz uma caminhada de 50 minutos até o bairro onde ela viveu boa parte da sua vida (em San Salvario) e que, inclusive, era onde que eu morava antes de me mudar para meu atual bairro.
Foi uma ótima caminhada. Acabei passando por lugares que eu ainda não conhecia na cidade, depois ainda terminei o dia tomando um belo spritz no parque, na beira do rio. Mas não sem antes tirar muitas fotos diante da plaquinha em frente ao seu antigo edifício, sob o olhar de estranhamento dos atuais moradores (naturalmente, sem me importar niente com isso).
A leitura de Léxico Familiar avançou desde esse passeio e já rendeu anotações de outros lugares que eventualmente me conduzirão à novas caminhadas por Turim, em busca de olhar a cidade sob uma nova perspectiva, agora sabendo de fatos que aconteceram em pontos específicos por onde eu passei tantas vezes, em outros tempos, distraidamente.
Agora ficou tudo mais divertido - e emocionante.
Eu juro que eu queria, mas eu não consigo simplesmente colocar meu tênis e uhuuu, vou ficar gostosa/saudável! Por isso (e muito mais), obrigada, Natalia! De onde você estiver, saiba que está ajudando outra escritora antifascista a ficar menos descaralhada da cabeça, já que caminhando eu passo menos tempo pensando, e quanto menos eu penso, menos eu fico neurótica, e quanto menos neurótica, menos eu me sinto culpada e, de quebra, ainda fico menos sedentária.
Precisamos falar de Enxame!
Agora, tem uma coisa que atualmente é inegociável na minha rotina: minha vida notívaga reservada para assistir filmes e séries com o meu namorado. Somos dois cinéfilos vampiros inveterados. Ultimamente não podemos nos queixar das nossas maratonas, porque a coisa aqui deu uma subida de nível considerável. Depois de The Bear, entramos num período meio esquisito, porque tudo parecia meio mais ou menos. Mas agora, ufa… tá ficando bom de novo. Além de Succession, Treta e algumas delícias mais, essa semana a gente caiu nas graças de Swarm (Enxame), que é simplesmente do mesmo diretor de Atlanta, Donald Glover, em parceria com Janine Nabers.
Terminei o primeiro episódio buscando um copo d'água e exclamando: "Socorro! Eu tô avassalada!” Se essa expressão não existia, eu inventei naquela hora!
Eu gosto de vários estilos de séries, mas tenho uma predileção por esse tipo, que desgraça a minha cabeça. É surreal como o primeiro episódio já entrega tuuuuudo em poucos minutos. Respira só pra tu vê! Capaz de perder o fio da meada. Em meia hora a história se desenrola e te mostra o perfil da protagonista, as motivações, tudo muito bem roteirizado e dirigido. Pra mim, é mais do que diversão, é uma verdadeira aula.
A trama de suspense mergulha na obsessão de Dre (Dominique Fishback), uma jovem fanática pela estrela do pop Ni'jah, vivida por Nirine S. Brown e inspirada na cantora Beyoncé. A obstinação da garota acaba se desdobrando em decisões irreversíveis e consequências sombrias. A série traça um paralelo com a relação macabra que criamos com as celebridades, permeando entre fantasia e realidade.
Para o nosso deleite, a maravilhosa Aline Valek também andou desgraçando a cabeça assistindo essa série e discorreu lindamente a respeito dela na sua newsletter. Dá uma lida lá que vale a pena.
E por hoje é só.
Volto com mais obsessões, leituras, caminhadas pela cidade, neuroses, com ou sem Patrulha da Fraude no meu cangote, mas volto.
Em tempo: mesmo sem conseguir ainda estabelecer uma comunicação eficiente com a minha nova assistente, a Alexa, encontrei algumas utilidades que achei apropriado compartilhar aqui. Estou particularmente viciada no grito do Michael Jackson e no dialeto baleiês.
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Um beijo e até a próxima edição!
Roberta Simoni
Como não sou bobo. Li, gostei e já printei o nome das séries tb. Amém senhor, tenho prime e star+.
Admito q tenho uma raivinha quando vejo dicas de série que eu não tenho a assinatura do canal. Garro ranço da série.
Tá tá tá sou estranho!
Que coincidência maravilhosa ambas termos começado por As Pequenas Virtudes e amado. to muito feliz de ter conhecido sua news e amei como vc escreve com o coração. prazer enorme <3